domingo, 20 de julho de 2008

Nadando contra corrente

Acordar, me arrumar, engolir, sair. O sol mal nasceu, e o dia já começa frenético. Trabalhar, trabalhar... (Nossa! Já deu a hora.) Juntar tudo, desligar tudo, sair correndo. Pegar ônibus, descer. Pegar outro, descer. Assinar o ponto, pegar o giz, o material. (Ah, já ia me esquecendo das fichas de chamada!) Abrir armário, fechar armário. Primeira turma: explica, escreve, explica, apaga, mostra o livro, faz mímica, corrige. Segunda turma. (Séries diferentes no mesmo dia: Onde foi mesmo que eu parei na semana passada? Nunca lembro direito!) Terceira turma: repete o script da primeira. Acabou. Hora de voltar. O sol? Nem o vi, encerrou o expediente muito antes de mim e levou junto com ele toda a minha energia.

Quatro anos de anemia depois, a única hora que importa é a de dar um basta. Que ciranda é essa que nos permitimos dançar em busca de um ouro de tolo? Consegui o teto que me abriga e já está de bom tamanho por hora. Foi dada a largada para o ócio criativo, para recarregar as energias, investir no que me dá prazer, em “bens duráveis” que malandro algum conseguirá me roubar, nem o fogo queimar e nem a água apagar. É chegada a hora de descobrir e desfrutar das pequenas riquezas que consegui colecionar até agora, nem que seja para justificar o esforço e a baixíssima qualidade de vida de tempos atrás.

Ao meu redor, o mundo continua insano na correria, assim como (quase) todos que vivem nele e o fazem rodar cada vez mais rápido. Não há muitas escolhas. Ou você entra na ciranda e gira junto até cair tonto, ou pula fora e observa de camarote. Decidi pular quando desconfiei que iria cair. E que gosto bom é o de dar adeusinho e sair sorrindo...

Aqui do lado de fora, escolhi estudar enquanto os cirandeiros giram e trabalhar quando quase todos já deixaram a roda. Não tenho saudades da comida mal feita que já cai doendo no estômago, nem das buzinas que entram doendo pelo ouvido. Não tenho mais saudades da minha cama nem do meu travesseiro. Agora conheço cada detalhe da minha casa. Faço presentes para os amigos. Tenho tempo de ver o que é bonito e registrar pra dividir com meus queridos. E de ouvir o que é bom (nem sabia quantos sons legais tenho em casa!!!).

Curiosamente, a coceira neurótica por sair em busca de diversão noturna ou pelo consumo supérfluo de luxinhos fugazes se foram como folhas secas na enxurrada. A cidade parece até mais bonita. Meu rosto parece mais saudável, vejo até novas cores nele. Aliás, tenho até tempo de olhar para ele. Descobri o significado de “Deus provê”: quando a grana aperta, uma porta se abre e as contas batem certinho antes mesmo que a respiração perca seu ritmo.

A vida é bem boa quando se aprende a vivê-la na velocidade certa... a dar a ela seu verdadeiro valor, assim como às coisas que a compõem. Tenho muito pela frente, mas a primeira lição já aprendi. A vida é o que fazemos dela.

Trilha sonora sugerida: RJD2 - “Since we last spoke”
Imagem retirada do site www.curado.com