sexta-feira, 22 de julho de 2005

Gosto não se discute?

Na minha frente, uma obra de arte. Pra que serve?
Estou de bom humor hoje: “Até que é bonita.” Mas ontem, quando a vi pela primeira vez, estava irritada com o motorista de ônibus que me fez correr e não parou. Achei bem feia. Quem vem de carro tem outra opinião? E quem não tem dinheiro pro ônibus? Será que há quarenta anos todos a achariam linda? E daqui a quarenta anos, qual será o julgamento que farão sobre ela? Depende de quem a verá?

Mas essa obra me conta uma história: a do povo daquele lugar, seus modos, seus gostos. É pra isso que serve então? Se não for belo, tem que ser, pelo menos, útil? Mas eu prefiro cores mais suaves, peles mais claras, cortes mais clássicos. E será que arte é preferência? Até que ponto preferências são diferentes de preconceitos?

Gostar não é julgar com preconceitos. No mundo da estética e da Arte, gostar é conhecer, acolher. A Arte não está aí para ser gostada e sim para fazer gostar. Transgredir os gostos estabelecidos. Fechar as portas das preferências subjetivas e preconceituosas. Abrir as da percepção e da compreensão de um mundo admiravelmente novo.

Despida de preconceito, aceito a obra na minha frente. E o que ela me faz sentir revolve toda a bagagem que trago comigo. Isso é a real subjetividade. Porque a minha bagagem não é a de mais ninguém. E o que isso tudo gera: conhecimento.

O bonito e o feio não têm mais importância se a obra me diz algo novo sobre um assunto velho. Se traz à tona novas reflexões, novas idéias. O primeiro dominó a cair é o do sentido. Os demais caem um por um alterando minha perspectiva da realidade.

Por tudo isso, o filme Exílios pode ser considerado uma verdadeira obra de arte. É um filme sem frescuras. Mesmo em Paris, os personagens estão literalmente despidos de interesses materiais. Um casal parte “em busca de lembranças”, rumo a Argélia. Como clandestinos, como andarilhos, como trabalhadores e como amantes (afinal é um filme francês). Os percalços, perrengues, mas as aventuras e as realizações estão todas expostas em contraste com a fotografia quase poética dos belos cenários que passam pelo caminho.

E como se não bastasse isso tudo, Exílios é revelador. Porque não mostra trabalhadores do campo sofrendo, nem andarilhos mendigando, nem ciganos malvados (sim, eles aprontam, mas enchem a barriga dos nossos heróis antes). Mostra uma ceia africana farta, mostra sensualidade na lavoura, muçulmanos alegres e uma surpreendente cena de exorcismo. Alguém aí já viu muçulmano chegado num tambor? Pois então, levem seus sentidos para passear neste final de semana. O filme está em cartaz....

"É o povo na arte e é a arte do povo" (Chico Science)

E assim também funciona a exposição Estética da Periferia, em cartaz no Centro Cultural dos Correios, até 3 de agosto, que tem como curador Gringo Cardia e veio para mostrar o belo e o feio na arte da periferia carioca. Tirou-a das ruas e a trouxe para um espaço de exposição. E a arte que passava batida agora é vista como deve ser. A exposição é interessante, divertida e moderna, à medida que convida o visitante a participar de algumas das instalações e até tocar em algumas das obras expostas. Mas confesso que nem toda carga de “preferência”, para não dizer preconceito, caiu por terra.

O graffiti, o hip hop, o funk, a calça da tchutchuca estão todos lá. Também estão lá turistas em meio ao lixo da Rocinha, a moda da Vila Mimosa (e um texto muito interessante de Marco Sabino sobre o estilo provocativo das meninas da Vila e das cachorras dos bailes), caixinhas feitas de lata de bebida usadas como “porta-drogas”, por Fernanda de la Roque uma moradora do Leblon, aluna da UFRJ (o que será que ela tem a ver com a periferia?!), a estética periférica de Chico Science a Nação Zumbi, no clipe “Manguetown” e as belíssimas telas dos grupos Nação, El Ninho e TPM Crew, além de Taz, de São Gonçalo, entre outros artistas.

Voltando o foco para a música, Chico Science transgrediu todas as percepções de música nordestina disponíveis até sua chegada às paradas de sucesso. Soprou com hálito fresco o maracatu e o rock e, junto com a Nação Zumbi e o Mundo Livre S.A., deu novos ares não só à música de sua região, mas à própria MPB. Foi, por isso, o maior artista da década de 90 e marcou definitivamente a história da cultura brasileira. Cada geração tem o Chico que merece. Nossos pais tiveram o Buarque. Nós, o Science.

Pois então que façamos o contrário de Heródes, a partir de hoje todos os meninos nascidos no reino Brasilis serão chamados Francisco, para que um novo gênio venha LOGO.

Dicas para o fim de semana

Sexta, sábado e domingo: feira de tatuagem
Sábado e domingo: feira hype em liquidação

quarta-feira, 20 de julho de 2005

Nervo Óptico - Piloto!

Nervo é cada um dos inúmeros filamentos que se distribuem pelo corpo, constituindo os órgãos da SENSIBILIDADE e do MOVIMENTO. Em algumas pessoas, o nervo óptico funciona mais ou menos como a antena da “Televisão” de Arnaldo Antunes, tudo que ele captar, o coração captura. A essas pessoas eu brindo com a palavra SENSIBILIDADE.

É a sensibilidade que nos permite, inicialmente, sentir alegria ao ver uma comédia ou ouvir uma canção, tristeza com o final de um filme, medo com o desfecho iminente de um conto. Ela não deixa passarem despercebidos detalhes que fazem a diferença. Aliada à Arte, a sensibilidade nos deixa suscetíveis a emoções incômodas, positivas ou negativas. Porque a Arte é provocadora.

E PROVOCAÇÃO será o tema desta coluna. Toda a provocação que passar pelos olhos e, que através do nervo óptico, for capturada pelo cérebro. Seja animada ou estática, escrita, representada, desenhada ou fotografada. Tudo o que provocar leituras.

O nervo óptico está sempre em busca de novas idéias para velhos escritos, novas formas para velhos conteúdos, velhas formas para novos conteúdos. Velhas ou novas: imagens e mensagens que movam e “rearrumem”. Ou que mudem os rumos. Ou que simplesmente rumem para o desconhecido, mas que certamente levarão a algum lugar. Nem que seja ao ponto de onde nunca se deveria ter partido. Porque o MOVIMENTO é preciso.

MOVIMENTO e SENSIBILIDADE caminham de mãos dadas com a ARTE e com os nervos, conduzidos por loucos, sábios, médicos da alma, companheiros de momentos de solidão: poetas das palavras, dos traços, dos gestos, das câmeras. Ação.

Nervo Óptico – a coluna – trará para você o lápis de cor do pensamento. Vindo do papel, das telas, dos muros, da rede. O nosso nervo está vivo e pulsa com vários ritmos e sensações, esperando por corações que venham bater conosco.

sexta-feira, 15 de julho de 2005

Nos tempos da pulga na cueca

Em tempos de dinheiro na cueca, como definir dinheiro sujo? É aquele que provém de meios ilícitos ou o que é escondido em lugares inóspitos (pelo menos no que se refere a dinheiro)?

E o que você faria se encontrasse uma mala de dinheiro “sujo” e tivesse apenas uma semana para gastar? Esse é tema do filme inglês "Caiu do Céu". Nele, dois meninos sortudos encontram uma bolsa de dinheiro roubado de um banco e têm uma semana para torrá-lo (ou não) antes que a país adote o euro.

Você correria para a Daslu? Ou compraria um deputado? Talvez essas não sejam mais as melhores formas de lavar um dinheiro que, se foi realmente roubado de um banco, nem é tão sujo assim...

Uma boa maneira de gastar (afinal os ingressos estão bem carinhos!) seria, entre uma comprinha e outra, assistir à invasão de filmes estranhos que assola o circuitão carioca neste final de semana. Até o Herbie, o Fusca que fala, resolveu dar as caras... Outras pedidas:

• "Camelos também choram" é um documentário sobre nômades, camelas com depressão pós-parto, camelos rejeitados e um músico herói, que de tão estranho deve ser bom. Pelo menos, pelos vários países onde passou fez sucesso. Dizem que é emocionante.
• "Fome de Viver" traz David Bowie, Catherine Deneuve e Susan Sarandon em uma história de vampiros e médicos... Se a sinopse não atrai, o elenco deve segurar bem o rojão.
• "Teorema" é uma produção italiana que conta a saga de um forasteiro que, ao visitar uma família rica, seduz a empregada, o pai , a mãe, o filho e some. Fiquei curiosa...
• "Em boa companhia" a maior (talvez única) atração do filme é...DENNIS QUAID. Nem preciso falar mais nada!!!

Quem correr, ainda pode assistir a "The Corporation", "Entre casais", "Exílios", "Espanglês", "Bendito fruto" e (este eu recomendo!) "Melinda e Melinda", de Wood Allen.

Mas o quente do final de semana mesmo é passar a noite de sexta no Circo Voador ao som dos 6 fabs (sim! Os ingleses eram 4, os de Pernambuco, 6), LOS SEBOZOS POSTIZOS. A inebriante guitarra de Lucio Maia arrasta os demais zumbis (Jorge, Djengue e Gustavo) mais Bactéria, do Mundo Livre S.A., pela antiga e maravilhosa fábrica de chocolates sonoros chamada Jorge Ben. É a Noite do Bem que, na cidade maravilhosa, já passou pelo Teatro Rival, pelo Jóquei Club e agora promete botar o Circo pra voar. Tomara que eles toquem “Tomorrow never knows”, dos fabulosos de Liverpool, esta noite. Vejo vocês lá!

Sexta-feira
• Bossal: André Nême (Sax e Tape), Nicolau Lafetá (Trompete), Daniel (Guitarra e Tape) e Felipe Zenicola (Baixos), ao vivo, às 19h, na Plano B - rua Francisco Muratori 2a, esquina com rua Riachuelo. Grátis. Cerveja por R$ 1.
• LOS SEBOZOS POSTIZOS: Circo Voador, R$ 30 (Não vou reclamar do preço salgado dessa vez – já reclamando! –, se fosse mais caro, eu pagaria feliz da vida!!!)

Sábado
• Cachorro Grande: Lona Cultural Gilberto Gil, 22h, R$ 14
• Black Alien toca no evento Brazilian Vibes – Vibrações Positivas pela Paz, Cais do Porto de Niterói – Armazém 2, R$ 25 + 1 kg de alimento não-perecível.

Quinta-feira (22/07)
• Dodomundi na Bukowski, Dodô coloca todo mundo pra dançar numa das melhores pistas da cidade. R$ 6

No outro final de semana
• Abertura do Club London Burning (ou Club LB), no Rua da Carioca 54, com uma programação que privilegiará o rock em todas as suas vertentes e os grandes nomes da música eletrônica nacional.

NANETE (uma subcoluna na coluna)

Links maneiros para os caseiros:
Os paulistas do Instituto (vou começar a cobrar a propaganda...) estão tocando na Europa.
• Dêem só uma olhada nos lugares maneiros onde representarão o Brasil, respectivamente em Londres e em Paris:
http://www.guanabara.co.uk/index.asp (Pouso certo na minha próxima ida a Londres!)
http://www.villette.com/manif/bresil2005/index.htm

• Desconfiem de artistas que falam de democratização musical e não seguem os passos de Lula Queiroga. Para os desavisados, trata-se do parceiro do Lenine. Para os mais antenados, um artista muito talentoso. As músicas do novo disco estão disponíveis com as letras na rede. Só não conhece quem não quer...
http://www.lulaqueiroga.com.br/

• Mais uma banda da boa safra capixaba, o ZéMaria mistura drum’n’bass, rock, MPB e experimentalismos. Audível no site:
http://www.zemaria.art.br/