Acabo de entrar na solidão a cabo…
Acabo de cair no 16 a cabo
Acabo me tornando usuário...
Do 12 pro 57 é um assalto
É um assalto...”
(Otto, “TV a Cabo”)
Há quem reclame (e muito!) da qualidade da programação da tv aberta, ou melhor, da falta dela. Obviamente, comparada aos canais de tv a cabo, a pobrezinha parece agonizar, padecendo com a ausência de criatividade e classe. Seriam seus últimos dias??? Não, claro que não.Apesar de os assinantes dos canais fechados serem pretensos formadores de opinião e também a fatia privilegiada que dispõe de boa conexão de internet, o que os coloca de frente para uma sobrecarga doentia de informação, não podemos nos esquecer que a grande massa da população continua assistindo aos canais abertos. E ela está se lixando para a participação de Rodrigo Santoro na terceira temporada da série australiana “Lost”. Compra tiragens e mais tiragens de revistas de fofocas sobre artistas das novelas das seis, das sete e das oito. Ignora as celebridades enlatadas de “Desperate Housewives”. A massa manda. Alguém duvida?
Em 2006, a banda Rebelde lotou estádios pelo país; Floribella foi a loira da vez entre a molecada e vendeu pilhas de brinquedos e sandálias; a entrada de Sônia Braga na novela repercutiu muito mais na carreira da atriz do que sua participação na série americana “Sex and the City”; os últimos episódios do massacre de Roberto Justus deram mais o que falar do que os debates de candidatos a cargos públicos do poder executivo local; e parte do elenco da vênus platinada debandou para a TV Record, cujas novelas estão obrigando Manoel Carlos e equipe a esticar os capítulos de seus passeios pelo Leblon.
O mais impressionante é que hoje na maioria das favelas e conjuntos habitacionais há um sofisticado esquema de “net cat” que permite aos telespectadores pagarem entre 15 e 40 reais para receber em casa um mix de canais tanto da Net quanto da TVA. É a democratização da informação televisiva. Só que mesmo com essa facilidade, são os programas da tv aberta que continuam dando mais ibope.
Infelizmente, tanto os que fugiram para a TV a cabo quanto a massa de telespectadores da TV gratuita perdem o melhor de ambas por pura desatenção. Prova disso é o índice de audiência de bons programas como “Arte com Sergio Brito” e “Recorte Cultural”, da TVE, e os jornalísticos “Tudo a Ver” e “Domingo Espetacular”, da Rede Record.
Ultimamente, observando com mais atenção os noticiários dominicais de variedades – o único tipo de noticiário a que me permito assistir, tanto pela falta de tempo quanto pela falta de paciência –, descobri o “Domingo Espetacular” (Record) que traz excelentes quadros sobre assuntos diversificados e curiosos, com a vantagem de ter uma dupla de apresentadores bem mais elegantes e tão inteligentes quanto os do equivalente global, além de informações menos parciais...
Há poucas semanas, durante uma crise gástrica que me forçou a sossegar no sofá, reparei nesse programa. Enquanto rodava de um canal para outro, me deparei com o “Diário de Olivier”, quadro em que o charmoso padeiro francês, Olivier Anchier, mostrava seu passeio por vinícolas portuguesas e um inusitado mergulho num barril de vinho. Dei um descanso para o controle remoto e uma chance à emissora. Bendita hora!
No bloco seguinte, um biólogo pra lá de aventureiro e divertido mostrava as curiosidades do mundo animal em viagens pelo Brasil. Nunca pensei que a fauna brasileira pudesse ser tão divertida até assistir àquele episódio de “Selvagem ao Extremo”, de Richard Hasmussen.
Já nos momentos finais do programa, Arthur Veríssimo, o mesmo que volta e meia contempla os leitores da revista Trip com matérias bizarras sobre a Índia e outros lugares tão esquisitos quanto, deu as caras em “Planeta Estranho”, bloco que apresenta e faz jus ao nome.
Ainda deu tempo de assistir no "Fantástico" às boas séries brasileiras “Poeira das Estrelas” e “Ser ou não ser”, produzidas, respectivamente, pelo físico Marcelo Gleiser e pela filósofa Viviane Mosé. Além de instigantes, trazem aos espectadores do programa a oportunidade de adquirir mais bagagem intelectual e expõem temas mais profundos do que os habitualmente tratados no programa. A esperança agora é de que novos produtos de mentes brilhantes nacionais como esses continuem chegando às nossas telinhas.
E assim, descobri um novo recheio para minha curta agenda de horas vagas em casa, composto de coisas interessantes, inteligentes e muito divertidas para ver na tv que prova ter ainda raras opções de alimento saudável para a cabeça. E, se no meio de um mar de “junkie food”, nada mais agradar, sempre vale a máxima “desligue a TV e abra um livro”. Desse quase nunca há o que reclamar! (Mas isso fica para uma outra história...) E, por favor, Euclides, avisa pra mãe que tudo que nem tudo antena captar, meu coração captura.
A arte desta coluna foi feita por Anderson Ferraro. Thanx, sir!
No dia em que se conheceram, ele passou a tarde toda atirado no sofá pensando se ia ou não à festa. Pensando se atendia o telefone ou não. Pensando se marcava ou não com os amigos. Pensando se ou se não. Ela estava muito triste, mas sabia que não podia parar. Tentava se recuperar do final traumático de um namoro que não devia ter durado mais do que três dias, mas chegara a três anos. Encheu-se de coragem apenas para ir ao cinema do outro lado da cidade. O brilho eterno de uma mente sem lembranças foi o estopim para concluir o óbvio. Tudo que fizera naqueles três anos, teria feito melhor se estivesse sozinha. O filme a deixara ainda mais melancólica, por isso não ligou para ninguém. Resolveu ir à festa. Do outro lado da Baía, ele também.