"Meus bons amigos onde estão", Frejat abre um dos
seus hits com uma pergunta que muitos se fazem, mas poucos admitem. Eu tenho
uns poucos, posso contar nos dedos das mãos. Amigos meeesmo. Aqueles que não
vivem grudados comigo, pois, se assim fossem, provavelmente não me aguentariam
- a distância é também parte do instinto de sobrevivência da amizade, sabiam?
Mas sei que são amigos.
E como é que faz pra saber quem é e quem não?
Os meus, além de não estarem sempre perto, sabem a hora
certa de aparecer. Intuem que conquistas são feitas para serem compartilhadas e
não têm qualquer problema ou dificuldade em iluminar o outro com sua nobre
presença. Nem é preciso dizer que a inveja pela glória alheia é colocada na
mesa e revertida em desejo de que novas invejinhas venham, seja em forma de
viagens, de conquistas, de histórias boas pra contar. Eu sou assim com eles,
eles são assim comigo.
Num dia desses, precisava dormir mais cedo e achei que
chamaria o sono assistindo a "Marley e eu", mesmo detestando filmes de
bichinhos. Enquanto morria de rir com as travessuras bizarras do labrador
protagonista, pensava por qual razão alguém manteria um cachorro enlouquecido
como aquele. Obviamente, ao final do filme, depois que a ficha já havia caído e
a ligação concluída, me perguntava quantos "amigos Marley" cada um de
nós mantém. Ou, pior, quantos de nós somos amigos Marley?
Admito que eu mesma não sou das mais fáceis. Um dos meus
melhores amigos mandou por sms versos de uma música que falava sobre vento
forte que não quebra nem entorta, mesmo depois de ter aturado malcriações e
crises de ciúmes brabíssimas despudoradamente assinadas por mim.
Viajei com minha-praticamente-irmã, por quase um mês, e
minha heroína me aturava cantarolar uma música nova a cada palavra inglesa que
lembrasse uma melodia. Ou seja, O TEMPO TODO! Só os chegados conseguem ter
noção do quão terrível isso pode ser, porque, além de desafinada, eu reinvento
as letras.
Desconfio que esses são os verdadeiros testes. É na hora do
aperto que descobrimos de que matéria são feitas as pessoas que nos cercam. E nos
últimos anos, os apertos peneiraram as pessoas que conheço. E poucas sobraram
sobre a tela. Aquelas que correram para segurar minha mão quando o pior
aconteceu. As que disseram "na hora que precisar, chama" e, quando eu
chamei, realmente apareceram. As que não esperaram eu chamar. O amigo de
infância que sofreu e chorou junto. A amiga que surpreende com flores e quitutes que acalmam o coração. Não é coincidência que essas mesmas pessoas
apareçam abraçadas comigo em registros de momentos felizes também.
Pensando em todos esses momentos bons e ruins, concluo duas
coisas. A primeira é que não sei, sinceramente, se estou à altura de pessoas
como eles. Não sei, mesmo, se conseguirei um dia ser pra eles o que são pra
mim. Essa gente que emerge do monte de coisas que têm pra fazer e cava um jeito
de me pegar pela mão e me levar pra um mundo fora do meu próprio umbigo, mesmo
que seja doloroso pra eles também.
A segunda é que há uma boa diferença entre gostar de uma
pessoa e ser amiga dela. Admiro e gosto de muita gente. Gente boa, divertida,
inteligente, de todo jeito. E acho que há um bocado de gente que até simpatiza
comigo apesar do meu temperamento. Mas, desse monte de flor que cultivei,
reguei, colhi para embelezar meu jardim, as folhas que, mesmo depois das
tempestades, permaneceram intactas, firmes, juntas aos meus galhos, essas vão
virar marcador para as melhores páginas do meu livro da vida.
“E meus amigos, cadê? Minha alegria, meu cansaço...” (Adriana
Calcanhotto)
2 comentários:
Você é inesquecível, importante e especial pra mim!
Flavinha, sem palavras. E isso é raro! Muito obrigada, querida! VC é incrível. Bjão!
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