segunda-feira, 21 de novembro de 2005

Jogando conversa dentro

Olá, como vai?
Eu vou indo
E você tudo bem?
Eu vou indo correndo pegar
Meu lugar no futuro, e você?
(
Sinal Fechado, de Paulinho da Viola)


Já reparou como anda difícil encontrar um bom papo?

Em tempos de Big Brothers e celebridades instantâneas, em que os líderes de audiência são programas que cuidam do que menos interessa – a (falta de) privacidade de artistas e famosos (geralmente, os menos interessantes), parece que a vida inteligente do planeta está se extinguindo.

Contudo, modismos à parte, interesse por fofoca sempre existiu, mas antes ainda havia espaço para assuntos menos supérfluos. Talvez, a lembrança dos tempos de ditadura ainda causasse cócegas nos mais provocadores. Em outros tempos, a roubalheira nas esferas da administração pública era mais velada, os primeiros casos a serem descobertos ainda cheiravam a novidade e até aqueles que puxavam as cobertas eram dignos de respeito e confiança.

Hoje, que graça têm discursos inflamados em prol da esquerda, se ela é a situação e está no governo (e “não no poder”, como bem lembrou Ariano Suassuna)? Que graça tem falar mal dos políticos se eles são os mesmos há mais de vinte anos e continuamos colocando-os onde sempre estão, de onde não saem e ninguém os tira. Que graça tem falar das novas falcatruas se são velhos ladrões quem agora botam a boca no trombone?
Mas a esterilidade do panorama é inversamente proporcional à criatividade das pessoas para manter um bom papo, ou pelo menos deveria ser. O tempo para começar, depois o futebol, o novo lançamento literário, o filme que acabou de estrear, o disco recém-lançado... essa poderia ser uma seqüência interessante para uma conversa bem (a)fiada.

O que é pior, uma mala pesada ou uma mala vazia?
Resolvida a questão do conteúdo, esbarramos em um obstáculo praticamente intransponível. A educação. Mais raro do que encontrar um bom papo é achar um bom papeador. Ninguém ouve mais. Todos estão surdos? De uma hora para outra, parece que todos só querem falar. Ninguém mais quer ouvir. Fala-se pelos cotovelos, sem respirar até! Não se dá mais a chance do interlocutor “locutar”. Ele está ali apenas para balançar a cabeça e dizer hum hum. E ai dele se não concordar...

Na próxima vez que for a um barzinho ou a um restaurante, observe as mesas em volta e veja você mesmo. De 10 mesas, sempre há pelo menos uma com um “palestrante” despejando sua sapiência sobre uma platéia acuada. E, pode contar, quanto maior for a platéia, maior será o timbre de voz adotado pelo “palestrante”. Porque ele não se satisfaz em calar os seus, ele quer atrapalhar as conversas dos vizinhos também.

Nunca foi tão real a expressão “jogar conversa fora”. Então, vamos começar uma campanha. Vamos nos policiar para não monopolizarmos os bate-papos. Vamos aprender a trocar idéias. Falar em tom moderado pode ser um sinal de boa educação, além de ser a deixa para que seu colega de mesa exponha um lado da questão que você ainda não havia enxergado. E se permita conviver com diferentes opiniões. Exercite sua tolerância. Dê a vez. Ceda a palavra. Isso, sim, é um bate-papo de verdade. A boa conversa é uma arte provocativa. Oxigena o cérebro e deixa todo mundo feliz. Isso é jogar conversa dentro!

Fundo musical:
• “Pop Song 89” – R.E.M.
• “Sinal Fechado” – Chico Buarque

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