sábado, 8 de julho de 2006

A força do prazer

Todo mundo deveria trabalhar só com o que gosta. Não é preciso fazer nenhuma pesquisa para comprovar o fato de que rende mais quem trabalha por prazer. Olhe em volta. Quantas pessoas você conhece que trabalham com o que gostam realmente e não por necessidade? Pouquíssimas? Nenhuma? Então, pense em uma escala maior. Pense em nosso país.

Brasil. População: 186 milhões de pessoas. Muita gente? E mesmo com toda essa mão de obra barata, mesmo com toda a extensão territorial, em proporções continentais, somos subdesenvolvidos. E não é só porque fomos colônia de exploração. Não é só porque tem muita gente “metendo a mão”. Graças a Deus, o número de “lalaus” é infinitamente inferior ao da população brasileira (esperamos!). Também é inadmissível dizer que o povo não gosta de trabalhar. Então, qual será o mistério da terra brasilis?

Se pararmos para analisar em quais setores o Brasil dá certo, a primeira palavra que nos vem à mente é CULTURA, em suas diversas formas: música, literatura, novela, moda... e até futebol, de vez em quando. Então, eu pergunto, será que Jorge Amado escrevia por obrigação? Será que Tom Jobim compunha apenas para botar feijão à mesa? Será que Alexandre Herchcovitch cria novas peças somente para pagar o aluguel? Já repararam no rosto do Ronaldinho Gaúcho durante os jogos do Barça? Não é possível que seja apenas por uma questão ortodôntica que aquele menino não feche a boca para jogar. Ele joga sorrindo! Ele se diverte com o que faz. E, benza Deus, é muitíssimo bem remunerado por isso. Mas, pelo visto, nem precisava. Ao que tudo indica, ele se divertiria do mesmo jeito se ganhasse metade (o que ainda seria muito!).

O contrário também acontece. Não raro ouvimos notícias de um e outro jogador em fim de carreira (mesmo que eles não se convençam disso), ameaçados de corte pelo técnico, caso não apareçam no treino ou façam o esperado – JOGAR DIREITO. Mas esses, cansados de guerra, entediados com a fama e marrentos demais para sentirem prazer com o que quer que seja lícito, não rendem mais. Já deram o que tinham para dar. A menos que estejam numa partida com amigos nas horas vagas, nas boates da Europa ou dirigindo carrões que compram com os prêmios por suas atuações, sejam boas ou medíocres. Aí, sobre salto altíssimo, o prazer está de volta!

Na música não é diferente. Sempre que se comenta sobre um músico que está fazendo cera para subir ao palco ou gravar um novo disco, é notório: sua criatividade já não tem mais o fôlego de outros tempos. Por outro lado, há os que nunca perdem a fome de bola. Como se vê nos milhares de DVDs lançados sobre a vida, a obra, os hobbies, as parcerias... de Chico Buarque. E provando que ainda bate um bolão, intercala ótimos cds, livros e fenomenais participações em trilhas sonoras para cinema e teatro.

Mademoiselle Garrafiel, editora do Armazém Literário, é uma abnegada guerreira que também entra em campo por puro prazer. Conduz o tal site com a seriedade de uma criança entretida com seu brinquedo favorito. E ai daquele que tentar tirar o brinquedo da mão dela. Leva até uma mordida. Que o digam os gatunos “jornaleiros” que andam espalhados pelas redações cariocas...

Com boa remuneração ou não, nosso povo tem um monte de talentos espalhados por aí. É gente que faz e deixa fazer. Há de chegar o dia em que as pessoas poderão escolher o que querem fazer e se preparar para isso. Então, nosso país será potência em muitas coisas, inclusive no orgulho que sentimos quando nos é dada a chance de exibir nossa Arte (e quando sabemos aproveitá-la), com reconhecimento garantido em palcos, telas, páginas, muros, passarelas e ouvidos do mundo inteiro. Seja ela com bola, com palavras, com notas ou peças, mas, acima de tudo, com muito prazer.
A arte que ilustra esta coluna é de Wagner Mourão. Thanx, boy!

Nenhum comentário: