sábado, 29 de julho de 2006

Resenha: GANGSTA RAP

Autor: Benjamin Zephaniah
Editora Cia. das Letras
254 páginas

O pai bebe e passa o tempo todo gritando com a mãe que, por sua vez, revida aos berros. A irmã mais nova ouve uma música irritante. Dentro de casa, ninguém se entende. Na escola, os melhores amigos já foram expulsos, a matéria é chata, os professores não dizem nada que se pareça com a realidade em que ele vive. E, por analogia ao que vê em casa, discute com um professor e ganha a expulsão e as ruas. Tudo o que ele quer é ouvir hip hop e fazer suas próprias rimas em paz. Como fazer uma história assim dar certo?
Até certo ponto, você deve ter pensado tratar-se de um adolescente brasileiro. Mas a sexta frase levou você direto para um gueto americano qualquer. Errei? Pois quem errou foi você. Estou falando de um guri negro de 15 anos chamado Ray, morador do East End Londrino, o protagonista do último romance escrito pelo inglês Benjamim Zephaniah. O autor, ainda pouco conhecido dos leitores brasileiros, porém manjadíssimo dos ingleses, é um artista na maior concepção da palavra. Faz poesia para crianças, romances para adolescentes, dub para adultos. Apresenta programas de TV e de rádio, inclusive para respeitada BBC. Assim como John Lennon, recusou o título de Oficial da Ordem do Império Britânico, uma comenda oferecida pela Rainha da Inglaterra a poucos.
Em Gangsta Rap, Zephaniah, um artista negro rastafari, usa a sua própria experiência de vida para descrever uma realidade que pouca gente associa à Inglaterra. Um cenário de discriminação racial entre ingleses de etnias e bairros diferentes, sob o pano de fundo do estereótipo da delinqüência juvenil e no ritmo da batida do rap. Com uma linguagem muito próxima da que se usa nas ruas e uma trama envolvente, BZ cativa o leitor até a última frase. Ora surpreende, ora choca, diverte e emociona quem acompanha a saga dos três meninos da periferia salvos da marginalidade graças a um projeto educacional que aproveita seus talentos artísticos para mantê-los estudando. Mas esse é apenas o começo da história. Briga de gangues e um retrato emocionante e, por vezes, realista dos bastidores da indústria pop ajudam a tornar esse romance uma promessa de blockbuster.
Cabe ainda ressaltar a sensibilidade do tradutor, trazendo com naturalidade para a língua portuguesa a linguagem jovial e pouco convencional das ruas londrinas, e a elegância do autor que, apesar de dirigir seu trabalho para a moçada, em nenhum momento apelou para temas corriqueiros como drogas e sexo para prender a atenção dos leitores. Mesmo as mensagens mais pacíficas e edificantes foram passadas sem pieguice. Um livro para adolescentes que muitos pais e professores deveriam ler.

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